segunda-feira, 8 de novembro de 2010

- Um outro pode ser a gente; mas a gente não pode ser um outro, nem convém... - o Dr.. Hilário completou.

Aí, pois, apareceu aquele homenzém, com o saco mal-cheio estabelecido na ponta do pau, do ombro, e se aproximou para os da roda, suplicou informação: - O qual é que é, aqui, mò que pergunte, por obséquio, o senhor doutor delegado? - ele extorquiu. Mas, antes que um outro desse resposta, o dr. Hilário mesmo indicou um Aduarte Antoniano, que estava lá - o sujeito mau, agarrado na ganância e falado de ser muito traiçoeiro. - "O doutor é este, amigo..."- o dr. Hilário, para se rir, falsificou. Apre, ei - e nisso já o homem, com insensata rapidez, desempecilhou o pau do saco, e desceu o dito na cabeça do Aduarte Antoniano - que nem fizesse questão de aleijar ou matar... A trapalhada: o homenzinho logo sojigado preso, e o Aduarte Antoniano socorrido, com o melôr e sangue num quebrado na cabeça, mas sem gravidade maior. Ante o que, o dr. Hilário, apreciador dos exemplos, só me disse: - Pouco se vive, e muito se vê... Reperguntei qual era o mote. - Um outro pode ser a gente; mas a gente não pode ser um outro, nem convém... - o Dr. Hilário completou.

João Guimarães Rosa - Trecho do Grande Sertão: Veredas.

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